eu sobrevivi, mas quem disse que é um final feliz?

eu pareço bem, não pareço? acho que nunca devo ter parecido tão bem quanto agora. desde que nos conhecemos, também nunca ficamos tanto tempo sem conversarmos. mas você diria que isso não é nada. que a vida é assim, ela desfaz laços, ela leva as relações mais firmes ao chão, que um dia eu iria me acostumar. você me dizia que um dia eu seria como você. e até hoje o meu maior medo é me tornar como você. é verdade que vou amadurecer e, se tudo der certo, espero estar emocionalmente mais forte, apesar de tudo. mas não quero me tornar frio e indiferente desse jeito. não me identifico com isso. eu sou quente e caloroso, um pouco melancólico, é verdade, mas você não tinha o direito de me apagar daquele jeito. eu era uma xícara de melancolia. você me transformou em um mar de luto.
já faz bons meses que não nos falamos. eu passei por todos os estágios: já senti felicidade, alívio e já quis morrer. às vezes ainda quero morrer. eu já substituí você na minha vida, estou conhecendo outra pessoa que, ao que parece (mas você também parecia, então não significa nada), é bem mais compreensível do que você um dia seria, não que você não fosse compreensível, mas você era incapaz de me entender. incapaz de me entender porque sou movido à sensibilidade, emoção e empatia. tudo que eu fiz que pareceu desesperador no fim da nossa relação foi uma tentativa fracassada de tentar fazer você me entender. de tentar fazer você assimilar pelo menos um terço da dor que eu estava sentindo.
mas você nunca assimilou. você nunca entendeu. você era experiente demais pra isso, mais velho demais pra isso, calejado demais pra isso, frio demais pra isso, porque a vida te tornou frio, você mesmo disse que na minha idade você era mais parecido comigo. a vida deixou seu coração dormente e você inevitavelmente se tornou manco, porque um coração que não sente completamente não aceitaria um amor puro. seu amor sempre seria assim, errante. um vexame.
eu sei que pareci desesperado, mas foi porque eu queria um acordo, eu queria ser compreendido, eu queria ser abraçado. e por algum tempo, eu não me importava se tivesse que ceder. foi doloroso ter terminado a nossa relação me sentindo incompreendido, isolado e sozinho. você era aquele que eu mais amava. aquele com quem eu mais me importava. eu saía da minha cidade pra ver você. eu largava e faltava por dias, a semana inteira na faculdade. eu enganava os meus pais sobre meu paradeiro, não fazia isso nem durante a adolescência. eu cruzava distâncias nunca antes cruzadas, eu navegava por mares nunca antes navegados. teve aquele dia que topei com meu pai na rodoviária e eu bolei uma história ridícula que esperava uma amiga que estava vindo de São Paulo, mas a amiga que estava vindo de São Paulo era você, Thiago. mas alguns meses depois, você não me entendia. não entendia a minha dor, não entendia o meu sentimento, como eu fui capaz de gostar de você, você colocou a culpa na minha idade, como se eu tivesse responsabilidade pela sua incapacidade de sentir também. minha maior ilusão: ter tentado inserir você na minha vida, acreditando que você gostaria de me inserir na sua.
por essa razão, você poderia só ter aceitado a minha proposta de término, mas você me fez passar por um calvário. você me machucou com suas tentativas de me fazer ficar sem realmente olhar dentro de mim. olhar pra mim. olhar por mim e entender o que eu precisava. você me disse que estava chateado, e quando eu voltei atrás, me sentindo absolutamente pior por ter machucado você também, então você ficou satisfeito. eu me lembro. absolutamente egoísta e autocentrado em não conseguir entender o que eu dizia tão explicitamente, e só ouvir em sua própria mente a voz do próprio ego.
eu pareço bem agora, mas não estou. ainda não sei seguir sem você. minhas pernas ainda fraquejam. meu corpo ainda dói e eu me sinto tão menos que você e desde você, tão mais sensível, tão mais frágil, tão mais insignificante. eu choro se cometo um erro bobo na cozinha porque imagino que estou te decepcionando de novo, de novo, de novo e mais uma vez, e essa fita rebobina sozinha na minha memória. eu evito dormir mal, porque nesses dias minha cabeça se vira contra mim, e não tem outra, nesses dias ela só pensa em você. estou conhecendo outra pessoa e sei que sou capaz de gostar dele, não estou como você, manco, e meu amor não é errante. mas não tem jeito, uma parte de mim ficou com você. uma parte de mim ficou em nosso último encontro, quando eu estava desesperado e triste e você estava tão calmo e abstraído. uma parte de mim ficou no seu carro, quando me despedi de você e houve um movimento em que quase nos beijamos. uma parte de mim ficou com você quando eu disse não. quando eu evitei seu beijo e desci pela porta do carro. uma parte minha involuntariamente ficou, eu não sabia se sobreviveria sem ela, mas eu tive que tentar.
eu sobrevivi, mas não é um final feliz.
(espero que um dia você seja capaz de amar de novo. espero que esse alguém derrube todas as suas defesas. que esse alguém aqueça seu coração como se todo dia fosse uma noite de inverno. que te dê todo o conforto que eu não poderia ter dado. que um dia você se deslumbre com a vida de novo. não estou desejando coisas ruins. estou desejando que você encontre a parte de você que ficou por aí. estou desejando que reencontre o que te faz humano. é a coisa mais bonita que eu poderia te desejar.)

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