praia do futuro

quase um ano depois eu volto a pôr meus pés sobre a areia em que caminhamos de mãos dadas. fazia um dia de muito sol e estávamos com uma amiga minha, a água do mar estava quente como eu nunca tinha visto, e eu te ajudei a passar protetor solar nas costas. eu ficava admirado e feliz com cada centímetro de pele que eu ia tendo o privilégio de tocar, me sentia o cara mais sortudo do mundo. no fim da tarde, o vento quase levou nossa canga embora e estávamos com tanta fome que devoramos pastel com coca-cola. estávamos tão felizes, e todo o caminho à nossa frente parecia tão promissor e bonito e parecia que tínhamos nascido um para o outro.

e um ano depois, eu volto a caminhar sobre essas areias. dessa vez sem você, embora com a mesma amiga. 

o vento que quase levou nossa canga te levou embora. as minhas mãos não se encontram com mais ninguém, e elas estranham essa sensação. a água dessa vez também está gelada, e não fico muito tempo nela. eu ainda me lembro do modo glacial com que você me olhou quando estávamos perto do fim, e tenho tudo ainda fresco demais na memória pra conseguir me divertir em águas frias sem pensar em você. fico me lembrando dos passos que demos, dos lugares que pisamos, e fico pensando nessa praia, que é a praia do passado e é também a praia do futuro. de certa forma, ela guarda um pedaço importante de mim. ela guarda um momento. quando eu achei que tudo poderia ser diferente e que não haveria mais tanto sofrimento. eu queria que fosse mais a praia do futuro, mas é mais a praia do passado. eu queria escrever teu nome na areia porque o teu nome é ausência, e eu queria de repente te dar alguma concretude. só que a gente não existe mais, nossos passos também já foram apagados pelas ondas e qualquer gesto de te recuperar seria inútil.

mas a praia do passado guarda esse momento, do qual nunca devo me esquecer. e é por isso que é também a praia do futuro. o que ela guarda estará comigo em qualquer lugar.

como uma assombração ou não. faz parte de mim.

existe um vazio que me preenche quando eu entro no mar de novo. eu me lembro de ter tido a sensação, um dia, de que eu era o homem mais sortudo do mundo, e deixo escapar um sorriso. eu não tenho como estar mais longe disso agora. as ondas já levaram o seu nome, e eu sigo tentando escrevê-lo, tentando guardá-lo, pra não esquecê-lo, pra nunca deixá-lo.

inútil. 

a praia do futuro já me contou que você sempre vai embora, que não tinha como eu estar mais longe de você.

Comentários

Postagens mais visitadas