o digníssimo amor romântico e o lamento de um perdedor

o amor romântico existe e disso não tenho dúvidas, mas ele não é pra mim. é claro que existe o amor romântico, mas é óbvio que alguns de nós somos excluídos nesse processo. é fato universalmente conhecido que todo sistema e toda estrutura produz seus excluídos, fragmentados e apartados. o amor romântico funciona pra quase todos, mas não pra mim. porque não cumpro este ou aquele requisito.

o amor é a pior experiência de violência que sempre me acontece, que sempre me volta, que sempre me rasga e vai embora, mas insiste em voltar quando eu não sei me bloquear e ainda não sei me defender e é fato universalmente conhecido que toda história tem seu idiota, aquele personagem que faz rir por seu desastramento ou, no mínimo, desperta a nossa empatia devido à própria falta de sorte, eu sou este personagem idiota, de quem as pessoas riem por faltar este ou aquele requisito, e também de quem as pessoas acabam sempre sentindo pena e muita compaixão, sentimentos nobres e legítimos que me provocam nojo e desagrado.

depois o amor volta e me estende mão quando eu sou só medo e desamparo e quando estou quase acreditando no olhar com que as pessoas me olham, de pena e muita compaixão, como se fossem direcionados a um cãozinho abandonado. esses sentimentos me provocam nojo e desagradado, mas quando o amor me olha, sempre parece diferente. e é verdade que eu sempre aprendo muito com ele. mas o amor me bate. o amor me beija e depois me deixa roxo. o amor gosta de me ver sofrer. o amor mente pra mim. o amor nunca me amou. o amor nunca sequer gostou de mim. eu tento me defender, mas ele sempre me olha como se dessa vez fosse ser diferente. e me estende mão. e eu quero agarrá-la, porque estou cansado dos olhares de pena e muita compaixão.

e depois o amor foge. ou então ele fica. e quando ele fica, eu olho pra ele como se ele fizesse algo muito errado. eu odeio o amor quando ele faz isso, faz-se à vontade em casa. eu nunca digo nada, mas é quando eu mais tenho vontade de deixá-lo. me deixe, tenho vontade de dizer, siga seu script, não vai me machucar, estou acostumado. quanto mais ele fica, mais eu tenho tempo de gostar dele. quanto mais o amor fica, mais ele vai fazer doer quando partir. quanto mais o amor se declara, mais eu sinto como se fosse vítima de um atentado terrorista. e depois o amor murcha. quando o amor murcha, ele vai pra casa e me deixa sozinho. e eu me sinto absolutamente em paz. me sinto absolutamente em paz porque continuo a mesma personagem que me acostumei a vestir, aquela de quem as pessoas riem e a quem falta este ou aquele requisito. ainda sou eu, não mudei.

ainda sou a única coisa que sei fazer no mundo: ser digno de pena e de muita compaixão.

mas nunca digno do amor.

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