carta ao ex-amor da minha vida

algo dentro de mim me faz pensar que ainda vou levar muito tempo para perdoar você, para perdoar a maneira como acabamos e como aquilo me deixou desamparado. foi mais do que um término, foi a desintegração. eu, que não continha meu choro e tapava a boca com uma das mãos, e você, do outro lado, me dizendo que não me amava, que me via mais como um amigo e que queria se apaixonar de novo. você, do outro lado, indo transar com aquele menino que foi um motivo de uma briga nossa há alguns meses. apenas quatro dias depois da desintegração. eu, chorando no banheiro. você, gozando. enquanto eu sofria como uma cadela humilhada, você fodia aquele garoto e se sentia bem, se sentia em êxtase.
eu não tive coragem de perguntar quando foi que você deixou de me amar. acho que porque sei bem a resposta: você nunca foi capaz de me amar. mas passou todo esse tempo se enganando, e por consequência você me enganava também. eu acreditava em você, eu acreditei piamente em você, foi um vexame. confiava tanto em você que se você me dissesse que existe Papai Noel, talvez acreditasse. toda essa confiança nunca foi fruto de uma mera projeção minha: você realmente conquistou a minha confiança. o meu afeto. o meu tempo. o seu lugar junto a mim. você conquistou as pausas entre a minha inspiração e expiração. tudo aquilo ali também era seu. eu tinha um brilho nos olhos, era você refletido. você me fez acreditar no amor quando eu achava que não era mais capaz disso. eu te dizia o quanto te amava e você me dizia que me amava também. quando foi que o seu amor morreu?

seu amor nunca existiu.

você me deu tantos sinais de que talvez não me amasse tanto assim, de que talvez nem quisesse ser meu namorado. mas você tinha uma justificativa pra tudo, não era? você dizia que era o seu jeito. que era assim mesmo. que eu não podia querer mudar você, que amar era respeitar as diferenças. e, em certa medida, é mesmo. eu acreditei em você. acreditei que o fato de você não se esforçar pra me ver com frequência não tinha nada a ver com você não me amar. que o fato de você não me dar beijos, abraços e carinhos não tinha nada a ver com você não me amar. que você querer desesperadamente ficar com outras pessoas não tinha nada a ver com você não me amar. que você me dizer que não sentia saudades de mim não tinha nada a ver com você não me amar. você tinha uma justificativa para tudo. e eu ainda não me perdoei por ter acreditado em você, não me perdoei pela mentira que eu aceitei viver todo esse tempo, sem saber que era mentira, mas desconfiando, sempre em estado de alerta.
mais cedo ou mais tarde, as cortinas se fecham, não é? as luzes se apagaram e você tinha que ser você, e deixar de atuar. fui totalmente surpreendido com a sua instabilidade. com as suas dúvidas. com a sua distância. depois do quanto eu tinha me esforçado para te compreender, descobrir que há tanto tempo você já sabia que não me amava, mas estava deixando levar. até um momento que fosse melhor pra você. fui a sua muleta emocional até quando você precisou e você não parece ver problema algum nisso. parece natural, por que eu serviria para outra coisa? é natural me usar. não sirvo para nada além disso, nunca servi, sempre fui péssimo em ser importante.
eu não consigo perdoar você. e isso me destrói por dentro. eu perdi aquele brilho no olhar que era você. você me trocou por outro assim tão fácil e isso desintegrou a minha autoestima. e você ainda queria que eu ficasse feliz por ti. mesmo depois de todas as faltas, de todas as mentiras. de todas as idealizações injustas projetadas sobre mim, de um relacionamento perfeito, sem discussões, sem diferenças, sem inseguranças, apenas a parte boa, era o que você queria e é o que você quer... quer apenas o êxtase, a alegria, a paixão, o prêmio. como se qualquer relação não fosse uma construção diária. e como se não fôssemos humanos sujeitos inevitavelmente à falha e à dor.
você nunca me amou. e você nunca quis estar em um relacionamento comigo.
mas eu, do contrário, aprendi a amar você. eu me dediquei todos os dias pra que tivéssemos uma relação harmoniosa, feliz, que fosse capaz de sustentar os problemas quando eles aparecessem. eu dei tudo o que eu podia dar, mas sentia você frequentemente nos testando. você esteve comigo até o seu último dia de dúvida, esteve comigo até o último dia em que precisou de mim. eu não fiz você de muleta, e agora não tenho nada em que me apoiar. nada que faça valer a pena continuar respirando. nada que dê algum sentidozinho para uma existência pequena, em um corpo frágil, feio, insignificante e desesperado por afeto genuíno.
eu vivi um sonho com você, mas eu acordei. e agora assisto aos meus sonhos queimando nas chamas. as nossas chamas. as cinzas são minhas. você escapou. eu estou preso aqui. em um incêndio que já dura quase um mês, em que descobri como meus sonhos eram frágeis, como eles se desfazem assim de repente. eu sinto o vento cortando o meu rosto e parece que é você me assombrando e tentando chegar ao meu coração de novo. estou preso aqui quando na verdade eu queria ir embora. pra bem longe. pra uma realidade em que ainda fosse possível construir um mundo com você. o nosso mundo. não sou exigente, pois pra mim não seria necessária revolução alguma: apenas alguma reforma. correções. pra vivermos a vida do nosso jeito. eu só tinha uma ideia, mas ainda assim pouca noção do quanto eu era fraco. do quanto eu era frágil. o sangue que corre dentro de mim queima como se fosse veneno. e eu só queria sair daqui. desculpa, eu estou chorando. estou chorando porque sinto a sua falta. não quero que volte, mas sinto sua falta. com você aqui este era um corpo mais fácil de habitar, com você eu tinha uma vida que era a que eu queria levar e viver.
mas se você nunca me amou e tudo foi uma mentira, o que eu faço com o meu futuro?
foi com você que construí a minha ideia de futuro. mas você não está mais aqui. e quem está?
acabou. você se foi, as cortinas se fecharam e as luzes se apagaram, as chamas continuam a crepidar e eu não sei quando isso vai parar de me consumir, eu não sei quando vou conseguir te perdoar.

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