Mas o que diabo é o amor verdadeiro?

Do tipo de coisa que é típica do nosso tempo, uma amiga se escreveu em seu aniversário um textão no facebook. Na postagem, um trecho em que ela agradece à vida pelo namorado que tem me chama atenção: "os 20 anos me trouxeram tudo que eu sempre quis: o amor verdadeiro".

Acho a expressão curiosíssima. Dá a entender que certos amores são falsos. Mas qual o critério? 

Acabou-se um amor de vinte anos. Foi verdadeiro?
Acabou-se um amor de cinco anos. Foi verdadeiro?
Acabou-se um amor de três semanas. Foi verdadeiro?
Acabou-se um amor de três dias. Foi verdadeiro?
Se o relacionamento dessa minha amiga acabasse amanhã (e como no momento em que escrevo este texto ela está feliz, que isso fique só pelo mundo das ideias), ela manteria o que disse, que foi o amor verdadeiro? Vai depender do motivo do término, se foi a mãe que mandou (ainda existe isso?), se foi traição, se foi uma oportunidade de emprego na Europa?

Mas findo o amor verdadeiro, há outro? Temos direito a mais de um amor verdadeiro? Ou tem-se um somente na vida e não há mais? Se não durar até a morte ainda pode ser verdadeiro? E sobre os que por aqui passaram e nunca encontraram o amor verdadeiro? 

Mas o que diabo é o amor verdadeiro? E é preciso ser recíproco para ser verdadeiro? Ou se não é recíproco então não é verdadeiro? 

Seja lá qual for o critério, não imagino que seja temporal. Já tive um amor verdadeiro de cinco dias, mas outro de três semanas tão pobre quanto o governo Temer é em legitimidade. Já senti em mim um amor de dois anos que foi, da minha parte, amor verdadeiro. Já tive amores de uma noite que sonhei verdadeiros, mas não sei qual critério me utilizo para dizer que não foram verdadeiros. Em termos práticos, foram reais, de carne e osso, realmente aconteceram. Não foram virtuais. Em alguns houve beijos, carícias, afetos, cumprimentos, preocupação com o bem-estar do outro. Isso não é amor? É. De uma noite só continua sendo? Continua?

Por outro lado, na minha dificuldade em definir o que é exatamente esse amor verdadeiro de que ela fala pode residir uma realidade dura: de que não sei porque não o vivi. E talvez quando viver, se viver, eu saiba. Aí talvez eu saiba dizer. E talvez num gesto de impulsividade como o dela eu classifique tudo que veio antes como falso. Não sei, acredito que não. Mas acredito em amor verdadeiro?

Eu quero acreditar porque acreditar faz bem e porque a utopia me faz continuar. Não acho, porém, que tenha a ver com casamento, igreja, vestido de noiva, algema, cobrança, contrato, tampouco exclusividade. A minha concepção de amor verdadeiro é bem mais singela. Acho que o amor verdadeiro é acordo, comunhão, partilha, afeto que sobra, sorriso e atitudes. Talvez seja uma visão tão idealizada quanto a do amor cristão, pode ser. Eu não saberia dizer. Mas, do fundo da minha alma, espero que o amor verdadeiro não me objetifique e seja muito mais do que carnal, embora possa e é muito bom que seja também carnal. Tomara que o amor verdadeiro esteja mais interessado em mim do no meu sexo. Disso eu já cansei.

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