sou o tipo de pessoa que vai embora
eu não sou exatamente quem eu pensava ser e ainda estou descobrindo como me sinto em relação a isso. quando mais jovens, achamos que podemos ser especiais de alguma forma. que nós temos os nossos princípios e que eles são inegociáveis. eu me pensava um garoto sensível e incapaz de pisar no calo de alguém. eu também me considerava coletivista, um humanista. talvez eu realmente fosse. e talvez eu, de fato, tivesse os meus princípios.
o que é essa vida que nos transforma, que nos retira, que nos revela? às vezes penso que sou irreconhecível pra mim mesmo. mas as pessoas ainda me cumprimentam quando me veem na rua. não tem como o meu rosto ser o mesmo. como elas não percebem?
como elas não percebem que já não sou tão sensível, que já não sou tão educado? que já não sou tão revolucionário e que, como tantos, me tornei quadrado? eu, que tenho sido tantas vezes egoísta. eu, que me retiro se já não tenho nada a ver com isso. eu, que aprendi a ir embora. ou a querer ir embora. e a maltratar enquanto não posso, enquanto não consigo. eu, que vivo no modo economia de energia e não atendo telefone. eu, que não quero saber da sua emergência, pois eu já vivo a minha. a minha vida é uma emergência que me consome.
de repente me sinto descoberto e revelado. eu já fui egoísta e já fui embora várias vezes antes. não sou apenas vítima e isso é ótimo, mas também não é. eu já disse coisas horríveis e já machuquei. eu já abandonei um melhor amigo quando ele mais precisava de mim. no dia seguinte, o despertador tocou normalmente e tudo começou novamente.
não sou quem eu pensava ser, pois acordo com o desejo de te deixar. eu sou parte do problema. tenho descoberto que sou o tipo de pessoa que vai embora.
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