museu de flores secas

I
as flores que você me trouxe
têm uma nova missão:
enfeitam a mesa da sala
desde então não durmo
às vezes fraquejo
num cochilo imprudente
mas acordo de repente
o coração saltando
pela boca
e a primeira coisa que procuro
é pelas suas,
pelas minhas flores
quero saber se já apodreceram
quero saber se já perderam
as cores
quero saber desesperadamente
quero saber tanto

II
adormecer me apavora
tenho a falsa sensação de que,
se me mantiver acordado,
então não serei apunhalado 
pelas costas
e então suas flores expostas
viverão para sempre

eu estarei sempre alerta
para que elas não ousem 
me abandonar
acho que elas não o fariam 
tão debaixo
dos meus olhos,
elas não o fariam talvez,
digo pra mim mesmo,
mas você o fez.

III
sei que fraquejo
mas não ouso adormecer
sei que desejo
uma porção de coisas 
mas não ouso dizer
só digo isto:
suas flores devem viver
para sempre
assim posso te manter
próximo por mais tempo
suas flores são ausência
suas flores são abandono
dos quais cuido 
com tanto carinho
no meu sono
só pra permitir você viver
mais um pouquinho

IV
em vão eu não pisco
eu não perco um segundo
não quero flores mortas
de podre já basta
o mundo

mas não ouso jogá-las fora
mas não deixo de contar cada hora 
como também não descarto
os ingressos pro cinema
ou aquele relógio que você
esqueceu

me mantenho acordado
e dedicado a nosso
museu

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